Milton Gonçalves

O Chacrinha tinha proximidade com as massas porque tinha uma linguagem simples, esculhambava os convidados e o público, mas em tom de brincadeira, com muito humor e respeito. Ele tinha uma personalidade muito forte e ficava muito chateado quando alguém não o entendia de prima. Dava muitas broncas no ar. Ser buzinado pelo Chacrinha era considerado meio caminho andado para qualquer artista tentar o sucesso. O Silvio Santos foi um carioca, camelô, que recebeu do Manoel de Nóbrega, pai do Carlos Alberto, a sua maior chance: assumir o Baú da felicidade. E como era um gênio, pegou essa chance e revolucionou a TV de entretenimento. O Faustão fazia o Perdidos na Noite, totalmente despojado, que chamou atenção pela originalidade. Vários programas como o dele sugiram na época, mas nenhum tinha o elemento mais importante: o próprio apresentador. Vários não tiveram o bafo da sorte. Faustão se destacou pela característica pessoal, pela esperteza. Não sei se emagrecendo tanto como esta vai ter o mesmo carisma. Na novela Que Rei Sou Eu, eu fazia um alemão – que bizarro! Novela de época com um negro fazendo um alemão. Entre outras coisas, me colocarem naquele papel foi um achado. A novela foi marcante por isso e pela visão moderna. Baila comigo pra mim foi um salto, o Manoel Carlos me chamou para fazer um consertador de bonecas, e como ele mesmo dizia um consertador de sonhos. Era casado com uma atriz branca, a Beatriz lira, que foi até aconselhada a não fazer o papel de minha mulher. Imagina naquela época o que foi eu era marido dela, e padrasto da mocinha Lídia Brondi e do galã e saudoso Lauro Corona. Isso provocou muitos debates. O movimento negro da época reclamava que eu não a beijava na boca. A Beatriz e eu então, com o consentimento do autor, resolvemos nos beijar em todas as cenas seguintes – para desgosto da minha mulher! A novela foi um sucesso e todas as amigas da minha filha Catarina e ela acharam que eu era realmente consertador de bonecas. Quanto dinheiro não gastei mandando consertar as bonequinhas escondido só pra não quebrar o sonho delas! Mas valeu a pena! Roque Santeiro – uma novela em que fiz um promotor, num papel que em outras circunstancias não faria. Obra de Dias Gomes, que era meu amigo íntimo. Pessoalmente os anos 80 pra mim foram anos muito bons para minha afirmação sem perder qualidade da inserção sem humilhação. Da minha ótica, foram anos revolucionários. Foram anos em que a volta à democratização tomou conta do mundo artístico. Os direitos democráticos já eram mais discutidos. A repressão não exercia seu poder, o povo voltava a buscar sua liberdade, inclusive na área artística. A campanha Diretas já – a TV ofereceu ao pais a movimentação pública da campanha pelas Diretas já. Eu, na TV, pela TV e por causa da TV fui escolhido pra ser um dos apresentadores. A TV com seu poder descortinou e deu mais elementos e mais matéria para que a discussão da redemocratização se realizasse ao vivo e a cores. Chico Anysio chegava ao topo da sua carreira, com sua critica sutil, elegante e afinada e com seus personagens, através da TV, dava os motes repetidos à exaustão tendo como missão a questão político-ideológica do País. TV mulher foi um programa na TV que num certo sentido colaborou para a independência feminina. A discussão às claras ajudou a condição da mulher no País. Nunca antes nesse País se falou tanto do gozo como nos anos 80. Xuxa e Angélica vieram na crista da onda de apresentadoras novas, rejuvenescendo quase que ao final dos anos 80 aqueles que até então eram as grandes estrelas. Pra mim então os anos 80 como artista foram muito bons, estávamos num Brasil novo e democratizado, buscando novos caminhos na TV. Tudo isso foi um grande desafio e tenho certeza absoluta que nos anos 80 nos demos um salto qualitativo na nossa produção televisiva.   Fonte: http://www.anosoitenta.com.br/televisao.html

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